terça-feira, 16 de junho de 2009

Detido por um súdito da Rainha


Cheguei convicto de que mais uma vez seria liberado sem maiores problemas; entreguei meu passaporte e fui logo lhe informando que eu estava em conexão para a Irlanda. Começou um interrogatório. Metade das coisas que ele falava eu não entendia. Fui entregando a ele todos os documentos que trazia na mochila, um a um. Mas o gringo parecia ter comido pão de alho com jiló, sem ter conseguido arrotar. Perguntou por que eu estava indo estudar inglês na Irlanda e não na Inglaterra ou no Brasil. Tentei explicar, já meio nervoso, a importância da imersão na língua como fator determinante para o aprendizado, mas meu inglês, que já não era essas coisas, travava, e as palavras nessa hora já não vinham na velocidade que precisava. O homem parecia convencido a desenvolver uma tese de que eu não deveria passar pelo seu país.

A idéia de que algo poderia dar errado rondou meus pensamentos. Foi então que ele preencheu um papel, entregando-me em seguida e indicando que eu deveria aguardar longe do balcão. Sentei sem entender bem o que estava acontecendo e li o formulário onde estavam marcados os seguintes itens: “I am detaining you”, “I have also detained your passport” e “Reasons for detention: I have further enquiries to make and more questions to ask you”, ou seja,no português claro, eu estava detido e seria investigado. Nessa hora consegui sentir o clima gelado de Londres, mesmo estando ainda dentro do aeroporto.

Percebendo que a coisa tava ficando séria, pedi a Deus que fizesse aquele oficial se convencer que eu não era alguém interessado em imigrar ilegalmente. Orei com a certeza de que Deus estava no controle de tudo e que Ele sabia das minhas intenções. Sozinho naquela parte do aeroporto, o silêncio reverberava como turbina de avião. Nada mais a fazer, sentei e esperei.

O homem levou meus documentos para outra sala e demorou uma eternidade e meia para voltar. Quando enfim retornou, devolveu os papéis e folheou o passaporte para, em seguida, estampar nele a permissão de entrar em Londres pelo período de seis meses. Feito isso, com a mesma feição carrancuda com que me recebeu, indicou-me o caminho para o embarque. Ganhei os corredores, imediatamente depois de perder toda a pressa e ansiedade. A mochila nas costas já não pesava. E tudo ao redor parecia flutuar junto com os meus pensamentos.


Próximo post: enfim, Dublin.

Todos os caminhos levam à Imigração


O céu de Londres saudou-nos com um belo azul, emoldurado na janela do avião. Deu pra ver uma quantidade absurda de aviões, que lembravam estacionamento de shopping em dia de sábado. Depois de 10 horas de vôo, a ansiedade de voltar à terra firme se confundia com o cansaço e a fadiga de uma viagem longa e nada confortável. Os ponteiros do Big Bem deveriam estar marcando quase duas horas da tarde quando o piloto, finalmente, abriu as portas da Europa para nós.

Saí do avião, junto com meu (agora) amigo uruguaio, que faria uma conexão para Manchester quase na mesma hora que a minha. Ao virar o segundo corredor do túnel notei uma aglomeração maior de pessoas a minha frente, e só quando já havia passado percebi que havia dois ou três homens fardados abordando aleatoriamente passageiros e solicitando passaportes. Respirei aliviado, imaginando que tinha escapado do revés de ser pego pela imigração logo nos primeiros metros percorridos em território europeu.

Depois de alguns corredores chegamos a um grande saguão onde, à direita, já havia uma fila com dezenas de pessoas aguardando serem atendidas em um pouco mais de meia dúzia de guichês. Algumas placas junto à fila informavam que ali era o atendimento para passageiros sem passaporte europeu, enquanto outra, à esquerda, indicava que passageiros com passaporte europeu deveriam seguir direto pelo corredor. Assim, meu amigo se despediu, assegurando-me que nos veríamos novamente, tão logo eu concluísse os procedimentos reservados aos imigrantes. Apresentou o seu passaporte da União Européia ao funcionário no local, e seguiu adiante, sumindo rapidamente em meio a curvas e corredores.

Fiquei algum tempo na fila observando o que acontecia ao meu redor. Pela movimentação, percebi que a maioria das pessoas tinha Londres como destino final. Achei que aquela poderia não ser minha fila, mas, na dúvida, preferi esperar ali mesmo. Um funcionário, com aparência de indiano, “varria” a fila, assegurando que todos estivessem com documentação em mãos, pronta para ser apresentada. Quando chegou minha vez, indaguei-lhe se aquele atendimento também era para passageiros em conexão. Não sei se ele me entendeu claramente, mas me mandou sair dali e seguir em um caminho por detrás dos guichês. Sem hesitar, abandonei a fila e rolei por mais alguns corredores, confiante de que a bendita conexão havia me livrado de encarar aqueles iracundos funcionários da imigração.

Segui a direção indicada, mas achei um pouco estranho não ver nenhum passageiro no caminho. Só parei quando dois guichês surgiram a minha frente. Em um, à direita, uma mulher, não exatamente simpática, parecia estar distraída em seu computador. No outro da esquerda, um homem branco, de meia-idade e com cara de poucos amigos, estava em alerta. Pensei em seguir para a direita, mas como não havia filas nem houve tempo: o inglês da direita interceptou-me com o olhar, como que dando uma ordem sobre onde eu deveria atendido.

Começava ali o momento mais tenso da viagem.